O poder de reverberação de uma ideia vindo de uma organização é maior do que o poder do indivíduo, salvo algumas exceções. Passamos a maior parte de nossas vidas dentro de organizações. É lá que criamos sonhos, projetos, casamentos, amigos, parceiros, etc. As organizações acabam nos energizando e, por vezes, servem de catapultas para sonhos maiores ou mesmo diferentes. Por meio das organizações criamos riquezas para nós e para os demais e transformamos o nosso entorno de forma virtuosa e perene. Eu sei que não é todo tipo de organização que é assim. Mas deveria ser. E mais, as organizações deveriam interferir positivamente na comunidade que estão inseridas, na sociedade e no país. Deveriam ajudar, literalmente, a construir países melhores, mais justos e éticos.
É possível isso? Sim, é possível e todos podem ajudar a ser assim. Você sabia que existem organizações com mais de 1.000 anos de vida e são todas familiares? O que elas têm em comum, além de outras características, é a ética.
O Brasil passa hoje por uma crise moral e ética extremamente complexa e desafiadora. A complexidade aparece quando analisamos o macro cenário e podemos ver que vários tipos de agentes: políticos, empresas, estatais, cidadãos etc, perderam o senso moral e ético e estão agindo, na maioria das vezes, sem serem responsabilizados, efetivamente, por seus atos e consequências. Tudo muito brando e lento em relação à justiça nesses casos. O desafio aparece quando o mundo precisa que os seus agentes: políticos, organizações, cidadãos, etc, canalizem suas energias para melhorar, em todos os sentidos, a situação do planeta como um todo.
As famílias, na sua maioria, estão relativizando os valores, morais e éticos, em função dos exemplos que aparecem todos os dias na mídia. Está cada vez mais difícil assumir uma postura ética individual, e sustentá-la, quando o entorno não valoriza isso. Muito pelo contrário, ridiculariza ações virtuosas feitas espontaneamente sem intenção de holofotes, reais ou virtuais.
O que fazer então? Jogar a toalha? Penso que não.
É nas organizações que devemos nos fortalecer e estruturar nosso pensamento ético e moral. É lá que esse pensamento vai virar ação e contagiar todos os colaboradores. Você já pensou que a força de uma organização com 10, 100, 1.000 ou 10.000 colaboradores vivendo uma agenda ética estruturada, verdadeiramente, pode fazer nas suas famílias e comunidades?
Por que nas organizações e não nas famílias?
Tivemos um equivoco muito grande. De 1964 a 2004, o ensino da ética e moral, campo da filosofia, foi suprimido das escolas em todo o Brasil. Os militares acreditavam que o ensino da filosofia nos fazia “questionar” e por isso aboliram das escolas. Foi substituído por uma disciplina chamada: Educação Moral e Cívica ou coisa parecida que nos ensinava apenas os hinos e nada mais relevante.Com essa ausência do pensamento filosófico ficamos sem aprender, verdadeiramente, o que é ética e moral. Eu asseguro, poucas pessoas em nosso país conhecem o significado e atuação desses temas.
Para recuperar esses 40 anos perdidos, além de criarmos professores de filosofia, o país precisa investir muito em educação e retomar esse pensamento. Isso ainda vai demorar alguns anos. É um processo lento e necessário. Assim, só nos resta acelerar o processo através das organizações. Para não perdermos uma geração toda, as organizações deveriam investir de forma bastante intensa levando para seus colaboradores o ensino da ética e moral, para que os mesmos assumam uma postura ética genuína. De preferência que isso seja feito por filósofos-eticistas e/ou estudiosos contumazes desses temas para que não aconteçam equívocos como estamos vendo.
Por exemplo: Você sabia que é errado falar “Código de Ética”. A ética trata do bem/mal universal. Se uma organização tem seu “código de ética”, isso indica que ela está acima da universalidade da ética, o que seria um grande absurdo. Na verdade o que existem e deveriam existir são os “Códigos de Conduta” que estão no campo moral, que tratam do certo/errado particular e/ou específico daquele grupo, ou seja, daquela organização. Mas como esses códigos foram feitos por administradores, controllers, advogados etc, e não por filósofos, acabam incorrendo nesses e em outros erros conceituais graves.
Finalizando, a minha tese caminha na direção que a educação ética filosófica correta deve estar em todos os currículos escolares: fundamental, médio e universitário. Enquanto isso não chega, devemos atuar com o desenvolvimento da cultura ética nas organizações, de forma bastante abrangente e cotidiana. Não só no departamento de Governança e/ou Compliance. A ética devera estar atrelada a todas as ações e resultados da organização. Ética e Moral são “pano de fundo” de tudo o que a organização produz, cria, presta, oferece, relaciona, etc.
E você, há uma Agenda Ética na sua organização? É ético lutar para ter, viu!
Francisco Santos, filósofo e professor de ética do MBA da Fundace.
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